segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O chá, cultivo colonial


Até ao século XIX, a China foi o único país produtor de chá para exportação, embora na Índia, no século anterior, se tivessem feito as primeiras tentativas de o cultivar. Estas tentativas foram travadas pela Companhia Britânica das Índias Orientai, por considerar que punha o seu monopólio sobre o produto em perigo. No entanto, as relações comerciais entre a China e a Grã-Bretanha pioraram durante as primeiras décadas do século XIX. Isto fez com que os britânnicos começassem a procurar novas regiões para desenvolverem o cultivo do chá, evitando assim, a dependência da China, o que acabou por acontecer em 1823, quando descobriram, na região de Assam, chazeiros silvestres. Assam situa-se no Norte da Índia, numa região que reúne as condições climatéricas e a altitude necessárias para o cultivo do chá. Um empregado da Companhia Britânica das Índias Orientais, Charles Bruce, dedicou-se a cultivar pequenas plantações de chá e convenceu os seus superiores de que o chá que cultivava tinha a mesma qualidade que o chá vindo da China. Em 1838, chegaram a Londres as doze primeiras caixas de chá procedentes de Assam. Com o aval dos peritos, no ano seguinte, fundou-se a Companhia de Assam, que começou a expandir-se a outras zonas do norte do país. A partir desse momento, a Índia, que era uma colónia britânica, transformou-se num dos maiores produtores de chá, e muitas famílias inglesas estabeleceram-se lá para tentarem enriquecer com tão promissor negócio.
Outra colónia britânica, o Ceilão, foi escolhida para ser um centro de produção de café. As selvas extensas do país foram devastadas para dar lugar a grandes plantações de café. Porém, depois de vários anos de trabalho, uma doença causada por um fungo - o Hemileia Vastratix - destruiu todas as plantas de café, produto que nunca mais foi cultivado em grande escala do Ceilão. (incompleto)

images in http://pt.wikipedia.org/wiki/Assam
in Ficha nº 12 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

sábado, 10 de setembro de 2011

O chá na época vitoriana



A verdadeira popularização do chá, em Inglaterra, deu-se no século XIX. Com a propagação da Revolução Industrial e a extensão das plantações na Índia e no Ceilão, fizeram com que o produto baixasse de preço, tornando-o acessível às classes sociais mais baixas.
O chá transformou-se, então, numa das bebidas nacionais, pois toda a gente - rica e pobre, camponeses e operários, podiam apreciar uma chávena de chá quente. Foi nesta época que se institucionalizou o costume de tomar chá à tarde: o afternoon tea.
Geralmente considera-se D. Ana, a sétima duquesa de Bedford, como a mentora desta tradição.A moda instalou-se em toda a cidade de Londres e, a partir daí, damas e cavalheiros distintos começaram a reunir-se em torno de uma mesa, com uma chávena de chá, biscoitos e bolos para conversarem amigavelmente. Com o tempo, o afternoon tea acabou por se estender a todos os grupos sociais.
Nos finais do século XIX, os salões de chá substituíram os antigos tea gardens, porque o costume de ir a estes estabelecimentos tinha começado a desaparecer, fazendo com que os chá só se tomasse em casa. A directora da sucursal da London Bridge, da Aerated Bread Company, foi a primeira pessoa a criar um salão de chá, ao servir chá aos seus clientes nas traseiras da sua loja. Teve tanto êxito que, em pouco tempo, outras pessoas a imitaram, abrindo salões de chá por toda a cidade de Londres e nas cidades mais importantes de Inglaterra. Clientes de todas as idades e classes sociais iam a estes estabelecimentos, onde, além de apreciarem uma chávena de chá, bolos ou sandes, podiam assistir a um espectáculo musical. A época áurea dos salões de chá foi entre 1901-1914, quando os grandes hotéis londrinos organizavam, à hora do chá, refeições elegantes animadas por conjuntos musicais.
Em 1913, com a chegada do tango argentino à Europa, entrou na moda dançar à hora do chá, o que provocou uma autêntica febre popular. Infelizmente, as duas guerras mundiais interromperam este costume, acabando com os salões de chá e fazendo com que os britânicos tomassem o chá em casa. Na década dos anos oitenta, no século passado, assistiu-se ao renascimento destes estabelecimentos e da tradicional hora do chá.


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in Ficha nº 11 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A época dos clippers

Em 1834, o monopólio comercial da Ásia, até então detido pela Companhia Britânica das Índias Orientais, chega ao fim. As rotas marítimas para a China, Japão e outro países asiáticos abrem-se a navios de outras companhias comerciais, que a partir de então competirão para levar o chá dos países produtores até aos portos de Inglaterra. Este trânsito vê-se aumentado pela invenção de novos navios, mais leves e rápidos que os anteriores, que fazem os trajectos em menos tempo. Estes navios foram denominados clippers.
O desenho dos clippers foi uma inspiração americana. O primeiro clipper zarpou dos Estados Unidos em 1845 e rapidamente se transformou numa ameaça aos navios britânicos tradicionais. A resposta inglesa não se fez esperar: em 1850, construiu-se o primeiro clipper britânico, o Stornaway, seguido de muitos mais.
Os clippers podiam alcançar uma velocidade de 18 nós. A importância da velocidade de um navio era fundamental para o comércio do chá na época: o primeiro chá a chegar ao porto de Londres era o mais caro, trazendo maiores benefícios para a companhia proprietária.
Para que os navios atingissem maior velocidade, a carga era disposta de uma forma mais estudada.
As porcelanas colocavam-se no fundo, fazendo ao mesmo tempo de lastro; os chás menos caros colocavam-se a seguir; acima da linha de flutuação. colocavam-se os chás mais caros.
Os estivadores asiáticos era peritos na arte de colocar as caixas. Além de maior velocidade, esta forma de armazenar a carga conseguia uma maior estabilidade, um elemento muito importante para lutar contra as monções, as correntes e os recifes.
Na década de 1850, tornaram-se muito populares as corridas de clippers ou corridas de chá, em torno das quais se gerou uma autêntica paixão pelas apostas. Vários navios zarpavam ao mesmo tempo da China, competindo para serem o primeiro a alcançar o porto de Londres. A tripulação que vencia recebia um importante prémio. A mais famosa destas corridas teve lugar em 1866, com a participação de 40 participantes. O vencedor foi o Taeping, que após noventa e nove dias de travessia, chegou ao porto vinte minutos antes do Ariel, o segundo classificado.
A abertura do Canal do Suez - que reduziu a viagem entre a Ásia e a Europa em várias semanas - em 1869 e o uso generalizado dos barcos a vapor provocaram o declínio dos elegantes clippers.

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in Ficha nº 10 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

O chá e o novo mundo



A chegada do chá à América dá-se graças aos colonos europeus. Os holandeses, estabelecidos em Nova Amesterdão - actual Nova Iorque -, foram os primeiros a degustá-lo, no princípio do século XVII. Se no Velho Mundo era um produto caro e exclusivo, no Novo Mundo o preço do transporte fazia com que só alguns privilegiados pudessem apreciá-lo. Os colonos britânicos bebiam o chá com a mesma cerimónia que na metrópole, porém, a pouco e pouco, foram introduzindo algumas novidades como, por exemplo, acrescentar açafrão, açúcar, canela ou casca de pêssego à infusão para intensificar o seu sabor.
Os acessórios necessários para a sua elaboração, nomeadamente chávenas e acessórios de prata e porcelana, também eram muito caros, pelo que se transformaram num símbolo de elevado estatuto social. A primeira loja a ser aberta no Novo Mundo estava situada a Norte de Massachusetts.
Para fazer chá em casa, os nova-iorquinos tinham de comprar a água, porque a água de que dispunham não reunia a qualidade necessária. Além disso, tiveram que instalar bombas de água em redor de Manhattan para assegurar o fornecimento. Com o passar do tempo, o chá foi-se tornando uma bebida imprescindível e a sua popularidade estendeu-se por todas as classes sociais. Os jardins de chá e os cafés que salpicavam as ruas das principais cidades adoptavam nomes ao estilo de Londres.
O chá teve um papel muito importante na independência dos Estados Unidos. Em 1767, o Parlamento britânico aprovou um imposto sobre todo o chá que se vendesse nas colónias americanas e que se destinaria a pagar os gastos do exército e do governo colonial. O novo imposto não agradou aos colonos, pois não havia maneira de o evitar: todo o chá que chegava às colónias britânicas era transportado pela Companhia Britânica das Índias Orientais, controlada pela Coroa. O mal-estar dos colonos traduziu-se numa oposição clara a que os navios descarregassem chá em alguns portos. A chegada de sete carregamentos de chá provocou revoltas em Nova Iorque e Filadélfia. Porém, o passo definitivo foi dado em 16 de Dezembro de 1773, quando Darmouth, um navio carregado de chá, foi abordado em Boston por um grupo de colonos disfarçados de índios americanos. Os colonos atiraram ao mar 340 caixas de chá que o navio transportava, desencadeando uma guerra com os britânicos. Essa guerra teve como resultado a independência das Treze Colónias britânicas no Novo Mundo, que deram origem aos Estados Unidos. Uma vez obtida a independência, o chá passou a ser consumido como acompanhamento às refeições. O próprio George Washington gostava de tomar chá ao pequeno-almoço acompanhado com bolos índios.

images in http://pt.wikipedia.org/wiki/Novo_Mundo
in Ficha nº 9 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

O chá impõe-se na Europa


No século XVII, a Holanda transforma-se no principal importador de chá para a Europa. A Companhia Holandesa das Índias Orientais carrega os seus navios, na ilha de Java, com chás da China e do Japão que, ao chegarem à Europa, são distribuídos por Itália, França e Alemanha. A própria Holanda deixou-se seduzir pelo chá. As novas-ricas damas burguesas gostavam de realizar cerimónias do chá ao estilo das japonesas, embora adaptadas ao gosto holandês. As participantes podiam chegar a tomar até quarenta ou cinquenta chávenas de chá e finalizavam sempre a cerimónia bebendo um pouco de brandy e comendo passas com açúcar.
A excentricidade destas damas surpreendia os seus contemporâneos, de forma que, em 1701, foi publicada uma sátira intitulada "As Loucas Mulheres do Chá", que criticavam acidamente estes comportamentos.
A fama do chá como produto terapêutico chegou rapidamente aos ouvidos da alta sociedade francesa e alemã. O chá chega a França pela primeira vez em 1637, desencadeando múltiplas discussões em foros académicos a respeito dos seus efeitos sobre a saúde. A pouco e pouco, a infusão foi vencendo os seus caluniadores e ganhando adeptos, alguns deles ilustres, como o chanceler Séguier, o cardeal Mazarino - que o bebia para curar a sua gota, - Madame de Sévigné ou o poeta e escritor Racine.
O chá chegou à Alemanha vindo da Holanda. Como era um produto caro, no início, só as classes mais ricas puderam consumi-lo. Isto impediu que se popularizasse e destronasse a cerveja como a bebida nacional, excepto na Frísia, onde actualmente continua a ser consumido.
Além da Grã-Bretanha, o país onde o chá terá maior aceitação será na Rússia, onde chega por via terrestre, transportando em longas caravanas, através das rotas asiáticas. O primeiro chá que chegou à Rússia foi um presente da China para o Czar Alexis I, em 1618. O produto despertou tal interesse que, em 1689, foi assinado um acordo comercial entre ambos os países para a sua importação regular. O intercâmbio era feito na cidade fronteiriça da Kayakhta, onde os russos trocavam peles por chá. As caravanas percorriam uma distância de 17.500 quilómetros, demorando entre dezasseis a dezoito meses a fazer todo o trajecto. Integravam-nas 300 camelos, cada um carregado com 250 quilos de chá. No século XIX, a construção do caminho-de-ferro transiberiano acabou com este trânsito, permitindo que o chá chegasse a Moscovo em sete semanas.
O preferido dos russos, até ao século XVIII, era o chá preto fumado, um produto tão caro que só podia ser consumido pelas classes altas. A forma russa de beber o chá era, e é, peculiar. Os russos gostavam de beber o chá em pequenos copos de vidro, acrescentando-lhe limão, mas nunca leite. Também o consumiam mediante pequenos goles, com um torrão de açucar preso entre os dentes. Para preparar a infusão, os russos inventaram o Samovar, uma mistura de bule e aquecedor de água.

images in http://pt.wikipedia.org/wiki/Samovar
in Ficha nº 8 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

domingo, 4 de setembro de 2011

O chá conquista a Grã-Bretanha


Na Europa, se alguma nação está associada à ingestão de chá é, sem dúvida, a Grã-Bretanha. A primeira referência escrita sobre o chá neste país aparece em 1598. Dois anos mais tarde, cria-se a Companhia Britânica das Índias Orientais, que conseguirá do imperador da China o monopólio do comércio do chá.
A primeira venda pública de chá em Inglaterra realizou-se em 1658. Um comerciante londrino, Thomas Garraway, anunciava a venda no seu estabelecimento do novo produto. Na sua publicidade, aludia às propriedades do chá com frases como as seguintes: "Faz com que o corpo fique mais activo e robusto", "Acalma a dor e a cabeça pesada, assim como os enjoos" ou "Evita os pesadelos, relaxa o estado mental e potencia a memória..."
Porém, a verdadeira eclosão do chá na Grã-Bretanha terá muito a ver com Portugal. Em 1662, Carlos II de Inglaterra contrai matrimónio com a princesa portuguesa Catarina de Bragança, uma grande entusiasta do chá. Quando foi para a corte londrina, a princesa levou uma caixa de chá da China como um dos mais preciosos tesouros do seu dote. Nos seus actos sociais, Catarina obsequiava os seus convidados com uma chávena de chá. Foi assim que a nova bebida se transformou na favorita da aristocracia inglesa. Graças também a Catarina de Bragança, a Companhia Britânica das Índias Orientais pôde aumentar as importações de chá. A cidade indiana de Bombaim fazia parte do dote da princesa, por isso os britânicos puderam contar com uma base de operações para o comércio na Ásia.
A partir do século XVIII, o chá transforma-se na bebida mais popular da Grã-Bretanha, substituindo a cerveja e a genebra. Um dos responsáveis pela popularidade do chá será Thomas Twining, que abriu um famoso e concorrido estabelecimento de vendas, o Tom's Coffee House, mais tarde transformado no muito popular The Golden Lyon. Assim, Thomas Twining só vendia chá de folhas soltas, servindo tanto os homens como as mulheres.
A pouco e pouco, o consumo de chá aumentou em todo o país de forma espectacular. No final do século XVIII, consumiam-se quase 7000 toneladas. O chá consumia-se em casa e nos famosos "jardins de chá", que substituíram os cafés devido à má fama destes. Os jardins de chá, situados nos subúrbios de Londres, eram considerados lugares distintos, onde os clientes podiam respirar ar puro, apreciar concertos, fogo-de-artifício ou corridas de cavalos e conversar calmamente, enquanto degustavam uma chávena de chá.

images in http://pt.wikipedia.org/wiki/Companhia_Britânica_das_Índias_Orientais

in Ficha nº 7 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Os navegantes europeus e o chá


As primeiras notícias que se têm na Europa a respeito da planta do chá provêm dos missionários e viajantes que visitaram o Extremo Oriente no final da Idade Média. Os árabes já conheciam o chá desde o século IX, sendo provável que algumas notícias sobre esta bebida tenham chegado a terras europeias durante essa época. A primeira referência escrita sobre o chá aparece no livro Delle Navegatione et Viaggi, escrito pelo veneziano Giovanni Battista Ramusio, em 1559, no qual se recolhem dados e notícias procedentes das viagens que se fizeram nessa época. A descoberta de novas rotas para o Oriente, especialmente depois da viagem do português Vasco da Gama, em 1497, abriu à Europa a possibilidade de estabelecer contactos com a China e o Japão pela via marítima, muito mais rápida e segura do que a terrestre. Desta forma, Portugal pôde estabelecer no ano de 1557 uma base comercial na ilha de Macau. Ali, os mercadores portugueses adquiriram, para importar paraa a Europa, seda e brocados, produtos de luxo, aos quais rapidamente se acrescentou o chá. O chá saía de Macau e, depois de uma longa travessia, desembarcava em Lisboa, de onde a Companhia Holandesa das índias Orientais o distribuía para os principais portos do Norte da Europa.
A fama do chá como um produto benéfico para a saúde espalhou-se rapidamente. O padre italiano Mateus Ricci, que ingressou na Companhia de Jesus em Portugal, escreveu numerosas cartas da China nas quais descrevia a colheita, a manufactura e os efeitos do chá.
Para Ricci, a excelente saúde e longevidade dos chineses devia-se ao consumo do chá. Nos primeiros anos do século XVII, a Holanda assume a relevância de Portugal no comércio com as chamadas Índias Orientais. A partir de 1610, os holandeses começam a importar chás procedentes do Japão, todavia, o sucesso do produto é tal que, em 1637, os mercadores começam a importá-lo da China, como se demonstra numa carta dirigida ao governador-geral da Companhia Holandesa das índias Orientais: "Dado que as pessoas começam a consumir chá, esperamos alguns potes de chás da China e do Japão em cada barco."
Na Europa, o chá foi recebido como um produto exótico, à semelhança da porcelana e das sedas chinesas. Os chás que chegavam aos portos europeus não eram adquiridos pelos compradores pelo seu sabor, mas pela sua raridade e pelos seus efeitos terapêuticos. Por esse motivo, as farmácias foram os primeiros estabelecimentos a vender as folhas de chá.


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in Ficha nº 6 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

A cerimónia do chá no Japão


Um dos cerimoniais japoneses mais influenciados pela religião Zen é, sem dúvida, a cerimónia do chá e todo o protocolo existente em torno dela. O Cha-no-yu ou "água quente para o chá" é um caminho de realização pessoal interligado com a disciplina Zen. A cerimónia do chá já existia desde o período Nara, porém, estava confinada a mosteiros e templos. O monge Eisai e o seu discípulo Myoe contribuíram de forma fundamental para a sua expansão que, por ordem de Ashikaga Yoshimitsu, estabeleceu uma regulamentação bastante rígida. Este encarregou a família guerreira Ogasawara da codificação da cerimónia, que resultou no aparecimento de uma obra de doze volumes chamada de Sangi-itto-Soshi. No entanto, é ao professor Noami (1397-1471) e à sua obra que se deve a configuração definitiva do ritual do chá como "via do chá". Os grandes mestres do chá brilharam especialmente no final do período Muromachi e princípio do Momoyama. O trabalho de protecção e mecenato das artes que realizaram determinados shoguns, como Yoshimitsu, deu lugar, além das transformações na cerimónia do chá supra citada, à configuração definitiva do Teatro Noh.
A cerimónia do chá é muito mais que o simples acto de beber uma infusão. O Cha-no-yu implica um modelo de comportamento, uma filosofia segundo a qual o homem se situa em harmonia com a Natureza e o Universo. A cerimónia é um modo de conceber o mundo, um caminho de contemplação e observação pessoal e de tudo o que nos rodeia.
Embora existam perto de vinte e quatro escolas nas quais se desenvolve a cerimónia do chá, há uma maneira tradicional de a realizar. A cerimónia celebra-se de preferência na casa de chá ou Sukiya, embora actualmente se possa realizar em qualquer sítio suficientemente calmo e íntimo. A casa de chá está sempre rodeada de um jardim, fechado com uma pequena cerca dentro da qual existe outro jardim interior. Os convidados - não mais que cinco - têm de se vestir de modo simples e austero. Em algumas escolas, podem pendurar no seu cinto um pequeno leque, símbolo das espadas que usavam os antigos samurais. Dentro da casa, os convidados esperam sentados no chão, sobre os calcanhares, que a cerimónia comece. Esta deve durar quatro ou cinco horas e tudo o que acontecer segue um guião pré-estabelecido: movimentos, palavras, silêncios, gestos, o que se comer e o que se bebe. A cerimónia do chá reúne todos os elementos essenciais da cultura japonesa: harmonia com a Natureza e as pessoas; respeito pelos outros, pureza de coração e de espírito e gosto pela tranquilidade e pelo sossego.

images in http://www.chanoyu.com/indexa.html
in Ficha nº 5 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O chá chega ao Japão


A China e o Japão, dois países vizinhos, sempre se influenciaram mutuamente. Por este motivo, é lógico que, depois de ser descoberto na China, o chá não demorasse a chegar ao Japão. Antes da planta e do seu cultivo, a primeira coisa que se conheceu no Japão foi a infusão. As folhas, processadas e prontas para o transporte, saíam da China e eram servidas na corte nipónica, como prova o facto de, no ano 729, o imperador Shomu oferecer chá no seu palácio a uma centena de monges budistas.
Pensa-se que as primeiras sementes da planta devem ter sido levadas para o país do Sol Nascente por um monge nipónico, Dengyo Daishi, que estudou na China entre os anos 803 e 805 d.c. Este monge, de regresso ao Japão, plantou as sementes nas hortas do seu mosteiro, sendo esta a primeira plantação de chá no país. Pouco tempo depois, o imperador Saga pôde conhecer, em primeira-mão, a deliciosa bebida e as suas virtudes, ao provar uma infusão preparada com plantas procedentes da horta do mosteiro. Gostou tanto da infusão que decretou que a planta se cultivasse em cinco províncias próximas da capital imperial.
Contudo, se o chá surpreendeu o imperador japonês, o caminho que a planta teve que percorrer não foi nada fácil. As más relações entre a China e o Japão entre os séculos IX e XI fizeram com que o chá passasse a ser uma planta desprezada na corte nipónica por ser de origem chinesa.
Apesar disso, as propriedades terapêuticas e relaxantes do chá fizeram com que continuasse a consumir-se nos mosteiros budistas, pois os monges notavam que, depois de tomarem uma infusão, ficavam com mais capacidade de concentração e podiam meditar durante mais tempo sem adormecerem.
Quando as relações entre ambos os países melhoraram, o que ocorreu no início do século XI, o chá recuperou o lugar privilegiado que anteriormente tivera no Japão. Novamente, um monge nipónico, Eisai, foi incumbido de levar as sementes da planta para o Japão, os novos costumes em redor do chá que tinham surgido na China como, por exemplo, o de consumir chá verde em pó. E o que é mais importante, levou consigo os ensinamentos da escola Rinzai do budismo Zen. Com elas, o ritual e o ideal do chá, já presentes nos templos chineses da época, impuseram-se no Japão. Por conseguinte, o consumo do chá e as crenças budistas evoluíram a partir de então de forma paralela, dando lugar a uma cerimónia complexa e única.

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in Ficha nº 4 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

O chá na China


Apesar das lendas, a primeira referência documentada sobre o chá na China remonta ao século III a.c.
Segundo estes textos, havia um conhecido médico que prescrevia a planta aos seus pacientes para aumentar a concentração. As virtudes médicas da bebida devem ter sido muito conhecidas na época, pois sabe-se que um velho general chinês, na mesma época, pediu por carta aos seu sobrinho que lhe mandasse "chá autêntico". Com isso esperava aliviar os males e pesares que a sua idade avançada lhe causava.
Desde sempre, o consumo do chá esteve ligado a usos terapêuticos e medicinais. Para preparar a infusão, usavam-se as folhas verdes e tenras de chazeiros silvestres. A pouco e pouco, as propriedades da planta fizeram com que o seu consumo fosse aumentando, por isso a planta começou a ser cultivada pelos camponeses chineses, ao mesmo tempo que o processo de elaboração se ia tornando um pouco mais complexo.
Durante o século III d.c, a planta começou a expandir-se para o Sul da China e para o Norte. O chá era tão popular e apreciado que servia como presente para os imperadores, ao mesmo tempo que, em paralelo, surgia um negócio próspero que enriquecia taberneiros, comerciantes e artesãos. Estes últimos idealizaram e fabricaram numerosos utensílios e artigos que serviam para preparar a infusão, muitos deles elegantes peças que realçavam o elevado estatuto social do seu possuidor. O chá também foi usado em algumas ocasiões como moeda de troca, pois os comerciantes usavam, nos seus negócios com os turcos, uma espécie de comprimidos prensados, feitos com folhas de chá verde, cozidas a vapor.
A Idade do Ouro do chá na China corresponde à dinastia Tang (618-906 d.c). Nessa época, o chá deixou de ser consumido exclusivamente pelas suas propriedades tonificantes, passando a ser bebido por puro prazer. Além disso, nessa época surgiram os primeiros costumes e cerimónias em torno do chá, assim como uma grande quantidade de cantos e poesias nos quais se elogiavam as suas reconhecidas virtudes. Nesta tarefa destacou-se o trabalho do escritor Lu Yü (733-804 d.c.), que compilou o primeiro grande livro sobre o chá, o seu Cha Chang. Neste livro, Yu recolhe todo o saber acumulado até ao momento sobre o chá: as suas origens, descrições da planta, variedades, processos de tratamento, propriedades, utensílios necessários para preparar a infusão e tradições sobre o consumo. Em torno do chá surgiu um cuidadoso cerimonial, no qual numerosas normas regulamentavam desde a forma como deviam colher-se as folhas até à forma como se preparava e se servia a infusão. As folhas tenras coziam-se a vapor, para depois serem amassadas e misturadas com sumo de ameixa, obtendo-se assim uma massa. Esta era depositada num molde e o resultado era uma espécie de comprimido que era seco no forno. Quando se queria preparar uma infusão, o comprimido era tostado e triturado até se transformar em pó, que depois era fervido. Era muito normal acrescentar algum produto que lhe desse um sabor mais intenso como, por exemplo, sal, casca de laranja, menta ou água de cebolas doces.

images in http://pt.wikipedia.org/wiki/Dinastia_Tang
in Ficha nº 3 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

As origens míticas do chá


As origens do chá perdem-se no tempo e só as lendas nos podem elucidar. Uma destas lendas atribui a descoberta desta planta, a Camellia Sinensis, ao imperador chinês Shen Nong, no princípio do terceiro milénio a.c. Este imperador tinha ensinado o seu povo a ferver a água antes de a beber, como medida de precaução. um dia, estando Shen Nong a descansar debaixo de um arbusto, começou a ferver a água para a beber e refrescar-se, quando uma brisa deixou cair na água algumas das folhas da árvore sob a qual o imperador se abrigava do sol. Shen Nong viu então que a água começava a ficar com uma cor acobreada: tinha nascido o chá. Segundo outro relato, depois de descobrir o chá, o imperador começou a experimentar fazê-lo com outras plantas, para descobrir assim se estas possuíam algum tipo de propriedades curativas. Esta prática era, sem dúvida, muito perigosa, por isso o imperador usava o chá para anular o efeit0 venenoso de algumas ervas e plantas.
A cultura japonesa, por seu lado, explica a origem do chá com outra lenda, que relaciona a planta com o budismo Zen. Segundo este relato, um monge asceta indiano, chamado Dharma, empreendeu uma viagem de peregrinação da Índia à China.
O monge queria permanecer acordado durante todo o caminho para, assim, praticar melhor a meditação. Um dia, esgotado pelo cansaço, adormeceu. Ao acordar, irado por ter quebrado a sua promessa, agarrou numa faca e cortou as pálpebras, para nunca mais voltar a cair em dita falta, e enterrou-as. No dia seguinte, justamente nesse local, tinha nascido uma planta: era a planta do chá. Depressa se apercebeu de que a planta tinha a propriedade de ajudar a manter os olhos abertos, afastando o cansaço. Tendo em conta as virtudes que descobrira, contou aos seus seguidores o que tinha acontecido e começou a usar o chá como ajuda para permanecer acordado durante a meditação. Quando prosseguiu a sua peregrinação para o Japão, Dharma levou consigo a planta do chá, introduzindo-a assim nos templos de budismo Zen daquele país.
Embora haja muitas histórias a respeito como surge a utilização da Camellia Sinensis tal como a conhecemos actualmente, a verdade é que o chá é originário da China e que o seu consumo remonta ao terceiro milénio a.c.

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in Ficha nº 2 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

A planta do chá


O chá Camellia Sinensis é uma planta de folha perense, pertencente à família das cameleiras. Os estudiosos identificaram três variedades da planta provenientes da China, Assam e Cambodja, todas elas usadas na produção comercial.
A planta produz folhas coriáceas de uma brilhante cor verde-escura, com pequenas e delicadas flores brancas de cinco a sete pétalas cada uma. As flores produzem um fruto semelhante à noz-moscada, que conté, de uma a três sementes.
Na colheita, apanham-se as folhas e, às vezes, as flores da planta, a partir das quais se elabora o chá. A colheita faz-se atendendo a alguns critérios de selecção das folhas, pois nem todas as folhas da planta servem para fazer chás de determinada qualidade. Em geral, apanham-se alguns rebentos e as folhas que se situam na parte imediatamente inferior dos mesmos. Dependendo do tipo de folhas apanhadas, far-se-ão chás de maior ou menor qualidade.
Existem três tipos de colheita:
  • A colheita mais fina, que consiste em apanhar somente o rebeto final e as duas folhas inferiores a este. Esta colheita faz-se muito poucas vezes por ano (entre 5 a 9, dependendo da altitude da plantação)
  • A colheita média é feita ao mesmo tempo que a mais fina, porém, a apanha prolonga-se por mais dias. Por este motivo, as folhas serão maiores e não proporcionarão uma infusão tão harmoniosa como a colheita mais fina.
  • A colheita tardia consiste em apanhar as folhas mais velhas, ou seja, o rebento e as três ou quatro folhas seguintes. Este chá, geralmente, é de pior qualidade que o das colheitas anteriores e costuma utilizar-se para misturas.
As responsáveis pela colheita são mulheres jovens que aprenderam o ofício de forma tradicional. Normalmente, cada uma delas apanha entre 27 a 30 quilos por dia. Uma vez apanhadas, as folhas devem ser transportadas para a fábrica o mais rapidamente possível, para evitar que comecem a murchar. É também importante que as folhas não se amontoem nem se esmaguem demasiado, e também que não se partam, o que poderia provocar o começo de reacções químicas nas folhas. Tem-se sempre muito cuidado para que as folhas cheguem à fábrica no melhor estado possível, porque o resultado de uma boa infusão depende, além da qualidade das folhas, do bom estado em que chegam à fábrica.
Uma vez na fábrica, começa a elaboração do chá, assim como a selecção das folhas destinadas a uma ou outra variedade de chá.
O chá preto e o chá verde provêm da mesma planta, pelo que as diferenças entre um e outro devem-se aos diferentes processos de tratamento das folhas.
As principais diferenças entre os diversos chás costumam depender do grau de fermentação. O chá verde não é fermentado, enquanto que o chá semi-fermentado fermenta-se em menos tempo do que o chá preto e o chá pós-fermentado fica a fermentar mais tempo que qualquer um dos outros.

image in http://pt.wikipedia.org/wiki/Camellia_sinensis
in Ficha nº 1 - "O Reino dos Chás" - Jornal de Notícias, 2005

O Reino dos Chás

Em tempos fiz a colecção de chás do Jornal de Notícias. Mas infelizmente não cheguei a dar muito uso a essa informação. Hoje estava nas minhas arrumações e encontrei a colecção de fichas e lembrei-me de partilhar com todos vós.

Boa leitura e espero que gostem.

Augusta